Escrito por Milena Vogado e Vitória Silva
No dia 19 de junho é comemorado o Dia do Cinema Nacional. Nessa data, no ano de 1898, foram registradas as primeiras imagens em movimento no território brasileiro, filmadas pelo cinegrafista italiano Affonso Segretto. E, devido a esse momento especial, decidimos relembrar um pouco da história e importância do cinema brasileiro.
Histórico
O cinema brasileiro passou por diferentes fases até chegar ao que conhecemos hoje. Inicialmente, os filmes exibidos no país tinham caráter documental. O cinema ficcional iniciou-se em 1908 com Os estranguladores, de António Leal. Após a Primeira Guerra Mundial, o cinema nacional foi deixado em segundo plano e substituído pelas produções hollywoodianas. Em 1929 surge o primeiro filme brasileiro falado, Acabaram-se os Otários, de Luís de Barros.
Na década de 1930 surgiram as primeiras empresas cinematográficas, produtoras de filmes do gênero chanchada – comédias musicais que logo foram caracterizadas como entretenimento das massas. Mesmo com uma fórmula bem simples, foi responsável por lotar as salas de cinema até meados da década de 50.
A obra O pagador de promessas (de Anselmo Duarte), ganhador do prêmio de melhor filme no Festival de Cannes, estreou, em 1962, o Cinema Novo, um momento de grande desenvolvimento na cinematografia nacional. Os filmes desse período representavam a realidade brasileira, mostrando a miséria e os problemas sociais.
Nas décadas de 1970 e 1980 o cinema nacional sofreu períodos de crise, com a substituição de filmes engajados por produções de consumo fácil, de caráter sexual – essa época é chamada de era da pornochanchada.
Os anos 90 trouxeram ao cinema brasileiro uma diversidade de temas e enfoques, com a geração de diferentes gêneros a fim de alcançar o maior número de público possível. O sucesso alcançado permanece no início do século XXI, com inúmeros filmes indicados ao Oscar. O surgimento de novas tecnologias atinge diretamente no aumento de produções – muitos pesquisadores caracterizam esse período como o momento de consolidação da indústria cinematográfica do Brasil.
Cinema na ditadura
Durante o regime militar o cinema brasileiro vivenciou um paradoxo: era financiado pelo mesmo Estado autoritário que praticava a censura. O Estado, por sua vez, sabia que era preciso apoiar a indústria cinematográfica, sempre evitando que ela evidenciasse suas críticas ao regime. Passou, então, a financiar obras, mesmo que elas não expressassem puramente a ideologia dos militares.
O Serviço de Censura de Diversões Públicas (SCDP), integrado ao Ministério da Justiça, era responsável pela censura dos filmes. Análises irresponsáveis motivaram a falência de muitas produtoras e quedas em bilheterias. Os conhecidos “anos de chumbo” (período entre 1968 e 1974), foram marcados por uma censura paranoica, que via em qualquer diálogo uma propaganda subliminar do comunismo.
Entre as décadas de 1960 e 1970 surgiu o Cinema Marginal, baseado no cinema experimental e de caráter radical. Era um movimento composto por cineastas contrários ao caráter industrial trazido à produção cinematográfica pela Embrafilme.
Próximo ao fim do regime militar, o cinema brasileiro passou a documentar uma memória da ditadura, sobretudo nos anos de chumbo. Após a crise dos anos 1980 e início dos anos 1990, a ditadura militar voltou a inspirar dezenas de filmes brasileiros – tanto no plano do documentário quanto no da ficção.
Os problemas enfrentados pelo cinema brasileiro
Mesmo com a retomada do cinema brasileiro após a ditadura, o que rendeu o lançamento de diversos filmes que atingiram um número elevado de audiência, o cinema nacional ainda enfrenta diversos desafios. Em função da escassez de investimentos governamentais nessa área cultural, torna-se muito difícil fazer cinema no Brasil, sendo muitas vezes necessário optar por alternativas como o barateamento de tecnologias na produção dos filmes, o que diminui a sua qualidade quando em comparação com outros países.
Com isso, o monopólio das grandes produções cinematográficas acaba se concentrando no eixo Rio de Janeiro-São Paulo, muitas vezes nas mãos de emissoras de telenovelas, que costumam optar por filmes de gêneros e elencos que repetem quase sempre a mesma fórmula de comédias. Além disso, há o preconceito da maioria do povo brasileiro que, na maioria das vezes, obcecados pelo formato das produções de Hollywood, não dão o devido valor à riqueza do cinema brasileiro.
Para a jornalista Camila Sousa, repórter de cinema do site Omelete, há um otimismo em meio à ascensão dos blockbusters de comédia já que, de certa forma, eles contribuem muito para a divulgação da produção nacional, por atraírem um grande público para o cinema. “Gostando ou não do estilo, não dá para negar que eles conquistam um público novo, que muitas vezes não era acostumado a ir ao cinema e pode começar a criar esse hábito. Além disso, há uma grande produção no cinema independente e documentários. Filmes como As Boas Maneiras (que tem um gênero mais voltado para o terror) e o documentário O Processo são grandes provas de que o cinema nacional pode produzir obras de vários gêneros”, afirmou ela.
Outro problema presente e pouco discutido é a falta de representatividade no nosso cinema, que é majoritariamente branco e masculino. Apesar dessa condição se expressar em vários países além do Brasil, ela merece certo enfoque por não refletir o nosso território extremamente miscigenado. Esse fato é mostrado através de dados levantados por uma pesquisa da Agência Nacional de Cinema (Ancine), que revelam, por exemplo, que dos 142 longas-metragens lançados em 2016, 75,4% foram dirigidos por homens brancos e, de todos esses, nenhum teve direção ou roteiro realizados por uma mulher negra.
Alguns filmes para você assistir
Na data de hoje, além de comemorar o início do cinema no Brasil e toda sua trajetória, também é necessário relembrar sobre a importância de valorizar a sétima arte nacional. Pensando nisso, separamos uma lista de filmes aclamados pela crítica e por prêmios internacionais, mas que não receberam a devida atenção do grande público brasileiro e devem ser assistidos:
- Central do Brasil (1998)
O filme que rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz para Fernanda Montenegro, além de concorrer na categoria de Melhor Filme Estrangeiro, é um dos filmes nacionais mais aclamados ao redor do mundo. Com direção de Walter Salles, o filme foi vencedor de mais de 15 prêmios, incluindo do Festival de Berlim e de Havana, e conta a história de uma mulher (Fernanda Montenegro) que trabalha escrevendo cartas e decide ajudar um menino (Vinícius de Oliveira) a tentar encontrar o seu pai no interior do Nordeste.
- O menino e o mundo (2016)
A animação dirigida por Alê Abreu foi indicada ao Oscar de 2016 na categoria de Melhor Animação. O filme conta a história do menino Cuca que, sofrendo com a falta do pai, sai de casa e descobre um mundo fantástico. O filme foi vencedor de mais de 40 prêmios em festivais, incluindo os renomados Annecy e Annie.
- O Palhaço (2011)
Dirigido e protagonizado por Selton Mello, o filme O Palhaço recebeu premiações no Festival Internacional de Tiburon e no Prêmio de Cinematografia ABC, e foi indicado a melhor produção no Festival de Chicago. A trama se passa em 1970 e retrata a história do palhaço Benjamin (Selton Mello), que passa por um conflito interno à respeito de sua vida no circo.
- Aquarius (2016)
Estrelado por Sônia Braga, o filme conta a história de uma mulher que passa a ser assediada e desrespeitada quando se recusa a sair do complexo residencial que viveu a vida inteira, após ele ser comprado por uma construtora que planeja demolir e reformar o edifício. A produção franco-brasileira foi muito elogiada pela crítica nacional e internacional, além de receber premiações em Cannes, Sydney, Lima, Havana, Cartagena e Mar del Plata.