Quando eu era criança tinha o costume de amar o natal e detestar o ano novo. Você pode pensar várias coisas, que eu gostava só dos presentes que no ano novo não tinha, ou que eu apenas era muito apegada aos anos. E devo dizer que essas duas ideias estão certas. Mas o motivo real é outro.
É que minha família sempre se reuniu para celebrar as festas de fim ano. No natal fazemos ceia no dia 24, onde nos abraçamos e brindamos com um sorridente “feliz natal” ao dar meia noite, e também nos encontramos para almoçar no dia seguinte, o famoso dia 25. Era esse dia, inclusive, o meu preferido: ganhava bastante presente.
Já no reveillon, fazíamos exatamente a mesma coisa. Ceia no dia 31 e almoço com um belo churrasco no dia seguinte. E ai de quem furasse ou chegasse atrasado a qualquer um desses dias de festança. Era bronca na certa.
No entanto, o que me incomodava em celebrar a passagem de ano, era que eu não via necessidade, nem importância. Na minha cabeça, não era pra se comemorar o ano que chega, e sim lamentar pelo que se foi, pelo ano de vida que todos perdemos. Enquanto meus pais e parentes bebiam na varanda depois dos fogos e dos brindes, eu não via mais relevância em estar lá. “Poxa, estamos cada vez mais perto da morte”, eu pensava.
Hoje, enquanto andava de ônibus e usava a janela como cantinho da reflexão (há algum outro melhor?), me lembrei do quanto eu estava apreensiva com o ano que viria no último dia de 2015. Eu tinha muitas preocupações: faculdade, emprego, mudar de cidade, talvez deixar o namorado, deixar a família pra trás. E todas essas dúvidas e inseguranças me assombravam. O que afinal eu poderia esperar de 2016?
Logo no início desse ano já me surpreendi. Minhas dúvidas foram sanadas e tive que fazer escolhas, não que eu me arrependa delas. Mudei de cidade e de casa. Assim como encontrei na nova cidade algumas pessoas que hoje posso chamar de casa e que me acolheram tanto no ano que termina. Apesar de não ter sido o melhor ano, até que 2016 me foi bom. Se eu pudesse dar um nome, daria “ano do recomeço”.
Ou, melhor, pensando bem, talvez “ano das mudanças” seja muito mais adequado se considerarmos que tanta coisa mudou, até o presidente do país. Ao contrário de muitos, não condeno 2016. Ele não tem culpa das coisas ruins. Sei que ele se esforçou para trazer apenas as boas. Quando penso nesse ano, me vem um turbilhão de coisas novas, notícias impactantes, recomeços diferentes.
E o que se pode esperar para o próximo ano, além de muitas outras coisas novas? Experiências diferentes e impactantes, muitos outros recomeços. Para cada fim, eu sei que 2017 vai providenciar um novo começo.
Ainda fitava distraidamente os apartamentos que passavam feito borrão diante de meus olhos quando soltei um sorriso de canto. Naquele momento eu só pensava na menininha que fui há anos atrás e que detestava as comemorações de ano novo. Hoje ela estaria orgulhosa de saber que cresceu superando a perda do ano que acabou. Ela estaria feliz de entender que não liga mais para o que perdeu, mas que apenas se importa com o novo que virá, com o resto dos anos que tem pra aproveitar e sempre mudar e recomeçar.
Ao menos nesse fim de ano, vou estar lá com a minha família comemorando o ano que virá mesmo após os brindes e fogos.
Crônica: O fim do ano que fez recomeços
Artigo anteriorEditorial: 2016, o ano que aconteceu
Próximo artigo Entrevista Fatos da Rua: jornal feito por moradores de rua

